Rede -> Notícias recentes   
Pesquisa de conteúdo ..:
Notícias | Eventos | Downloads | Links Úteis

:: PÁGINA INICIAL

:: ARTIGOS

:: FOTOS

:: EVENTOS

:: BOLSAS E CURSOS

:: IES COM PROGRAMAS PARA POVOS INDÍGENAS




ENTREVISTA com Wrana Maria Panizzi, Presidente da ANDIFES





Reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a professora Wrana Maria Panizzi tem como desafio presidir a Associação Nacional de Dirigentes das Instituições Federais de ensino Superior - Andifes, no exato momento em que o governo federal acena com a possibilidade de realizar uma Reforma Universitária. Nos dias 23 e 24 de março 2006, ela esteve em Belém, participando do terceiro seminário realizado pela Andifes, desta vez para discutir com a comunidade acadêmica da região Norte questões como currículos, avaliação e responsabilidade social das universidades públicas federais. Na entrevista concedida ao jornal Beira do Rio, da UFPA, Wrana Panizzi afirma que a universidade pública deve e precisa mudar em muitos aspectos; porém, nenhuma reforma servirá ao Brasil se for realizada com o propósito de diminuí-la.


Professora, qual a avaliação que a senhora faz sobre o seminário realizado pela Andifes em Belém para levantar subsídios à sua proposta de Reforma Universitária?


Wrana Panizzi: Eu quero parabenizar a Universidade Federal do Pará e a Universidade Federal Rural da Amazônia por terem acolhido e recebido a comunidade acadêmica nacional neste seminário que tratou da questão do projeto acadêmico, da responsabilidade social e da avaliação. Foi o terceiro realizado pela Andifes e em todos temos tido excelente receptividade por parte das comunidades acadêmicas. Percebemos a disposição e a responsabilidade dessas comunidades no sentido de discutir questões que são importantes para o futuro da universidade pública brasileira.


A senhora foi convidada pelo ministro Tarso Genro, da Educação, a integrar o Grupo Executivo da Reforma do Ensino Superior. Qual a proposta que a que a Andifes levará para as discussões?


Wrana Panizzi: A Comissão Executiva teve apenas duas reuniões. Eu não faço parte do governo, não me arvoro representante das comunidades acadêmicas, nem estou como representante da Andifes. Mas, evidentemente não declinei de um convite de poder participar. Como sempre tenho feito, levo as posições que construí ao longo dos anos e que compartilho com meus colegas, especialmente com meus colegas da Andifes. A Andifes terá, sim, uma proposta, que preserve, sobretudo, alguns conceitos básicos que estão vinculados à proposta entregue ao presidente Luis Inácio Lula da Silva no dia 5 de agosto do ano passado relativa à expansão e modernização do sistema público de ensino federal.


Defendemos a compreensão e concepção da educação como bem público, do conhecimento como patrimônio social. Defendemos a universidade como instituição republicana, que não pertence a nenhum governo, que atravessa gerações e governos e mantém seu compromisso maior com o conjunto da sociedade. Defendemos uma visão de sistema porque entendemos que nós somos 54 instituições federais de ensino superior e estamos presentes em todos os espaços, todos os estados do território nacional. Temos uma responsabilidade e um comprometimento com toda a nossa realidade. Por outro lado, defendemos também um projeto para a universidade pública que a considere não somente estratégica para o desenvolvimento, como também parte integrante de um projeto de nação.


A universidade pública não precisa ser reinventada. No Brasil, as universidades públicas constituem a base sólida sobre a qual deve se assentar qualquer proposta de reforma. Encontramos entre elas as mais antigas e qualificadas universidades brasileiras que são referências para o conjunto do sistema nacional de educação superior. Nossa universidade pública deve e precisa mudar em muitos aspectos; porém, nenhuma reforma servirá ao Brasil se for realizada com o propósito de diminuí-la. Bem ao contrário, nosso país precisa de uma universidade pública fortalecida, mais qualificada e acessível a um número muito maior de brasileiros.


Professora, as universidades federais possuem realidades distintas. Essas diferenças são observadas em relação à produção científica, ao número de alunos e à abrangência de seu raio de ação, entre outros parâmetros. A Reforma Universitária que começa a ser discutida no plano federal deve contemplar de forma diferente cada realidade ou o tratamento deve ser o mesmo, partindo da premissa que o ente universidade federal é único para todos os estados?


Wrana Panizzi: sem dúvida que qualquer proposta deve considerar a heterogeneidade e diversidade do sistema. Mas o tratamento diferenciado não deve ser no sentido de fragmentar esse sistema, mas no sentido de entender as especificidades regionais e, sobretudo, trabalhar com questões regionais que possuem também caráter nacional. Não podemos, absolutamente, esquecer que a questão da Amazônia não diz respeito só à população da região Norte do país, mas é uma questão nacional e, portanto, todos temos responsabilidade e compromisso com ela.


Uma das questões discutidas no seminário em Belém foi sobre currículo. Quando a UFPA assumiu efetivamente seu papel regional, fixando-se no interior da Amazônia, passou a ouvir críticas sobre o distanciamento dos currículos em relação às realidades municipais. Em que sentido uma Reforma Universitária pode avançar no sentido de resolver essa questão?


Wrana Panizzi: Acho que o projeto acadêmico da universidade é um projeto que se faz e refaz constantemente. A interação da universidade com a sociedade é extremamente importante porque torna possível à academia perceber experiências e vivências que acontecem fora dela. Por outro lado, a universidade pública brasileira não pode fugir de seu caráter de universalidade, do rigor científico, do rigor teórico, do rigor do método, mas, sem dúvida nenhuma, para que possa ser verdadeiramente uma universidade, tem que preservar o rigor da sensibilidade. É este rigor da sensibilidade que permite compreender e respeitar as vivências das nossas populações.


Uma das questões mais polêmicas deste momento é o estabelecimento de cotas para ingresso na universidade pública para determinados grupos sociais. Qual a posição da Andifes em relação à proposta?


Wrana Panizzi: Acho que esse é um tema que merece ser tratado com maior aprofundamento por parte da Andifes. Reconheço que talvez não tenhamos ainda feito uma discussão do tema como de fato ele merece. Questões como a dos negros, dos pardos e dos índios, são pouco discutidas como parte constitutiva dos nossos currículos e como parte das questões nacionais efetivamente. Este é um tema sobre qual a Andifes, com certeza, deve analisar e realizar uma discussão mais ampla.


Em artigo publicado no jornal da USP, a senhora disse que a universidade pública não pode ser vista como um “gasto”. Qual a visão que governo e sociedade fazem hoje das universidades federais?


Wrana Panizzi: Ao longo dos anos, as universidades federais têm buscado mostrar para a sociedade que gastar em educação significa, sobretudo, investir. Então, não se trata de gasto, mas de investimento. Cada vez mais essa compreensão se faz presente na sociedade. A população se dá conta que para ocupar o seu espaço no mundo do trabalho ou mesmo para melhor compreender o mundo contemporâneo, é preciso que as pessoas tenham acesso ao conhecimento, à educação. Portanto, no conjunto da sociedade há uma valorização muito grande da educação. E se há essa valorização, conseqüentemente a visão também se transforma no sentindo de entender que, sem educação, não há oportunidades de sucesso, de crescimento e de libertação, nem individual, nem coletiva. Então a educação começa a ser valorizada e respeitada como tal.


Infelizmente, por parte dos governos, especialmente das áreas econômicas, a questão da educação é vista ainda como um gasto. Temos buscado sempre explicitar esse posicionamento e mostrar, sobretudo, os resultados concretos. Se perguntássemos qual a contribuição que a universidade tem dado através dos recursos humanos qualificados que forma e do conhecimento que produz, bastaria observar o avanço do país na área do petróleo e no chamado agro-negócio. No ano passado, por exemplo, o agro-negócio assumiu um papel importante do ponto de vista do equilíbrio da nossa balança comercial. De janeiro a junho, a produção de grãos representou 13 bilhões de dólares na balança comercial. Isto tem valor agregado, portanto, ali tem resultados de pesquisas e de recursos humanos qualificados. Deste mesmo modo, a presença da universidade se observa na indústria farmacêutica, no avanço da fruticultura, no desenvolvimento das artes, nas pesquisas em águas profundas, na indústria aeronáutica que entrou definitivamente para a pauta das exportações. Isso tudo gera muito valor agregado. Por estas e por outras questões é que temos procurado demonstrar que isto só acontece quando há recursos humanos qualificados e quando há produção do conhecimento. Portanto, este valor agregado é produto de investimentos, cujos resultados são bem maiores que o próprio gasto efetuado. Este é um trabalho que deve ser feito permanentemente nessa direção.


As universidades federais continuarão a ser públicas e gratuitas?


Wrana Panizzi: Este é um princípio básico. Nós defendemos a universidade como uma instituição que deva ser pública e gratuita, cuja qualidade não pode ser descuidada, e que trabalhe no sentido da expansão. Por isso a manifestação da Andifes junto ao presidente Lula no ano passado no sentindo da expansão do nosso sistema e em relação à preocupação quanto à proposta da chamada estatização das vagas. Entendemos que é preciso, sim, que se dê a expansão e que ela ocorra dentro do sistema apontado por todas as avaliações como o de melhor qualidade que é o sistema público.

(Walter Pinto)